sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Enterro da Revista

As estreias das Revistas eram sempre lotadas, depois sua continuidade dependia se o público gostava, se as criticas eram favoráveis ou se o elenco era capaz de fazer o espectador sair da sua zona de conforto e gastar algum. Quando uma revista agradava ficava seis, oito meses dependendo do contrato com o teatro. No teatro João Caetano tinha um prazo para entregar o espaço, pois era do Governo e havia uma licitação para a ocupação do mesmo. Já no Recreio, propriedade de Walter Pinto ,ele decidia a data do término da temporada. Mas o que o público gostava mesmo era do enterro da revista e isto era feito na última noite. Trocávamos os papéis, improvisávamos e aconteciam coisas muito engraçadas. De repente, num esquete entrava uma vedete cantando ou dançando, coisas que nada tinham com a situação. O teatro esgotava e o público adorava, mas quem mais se divertia, eramos nós, pois a  loucura era total. Inventávamos um esquete dentro de outro, criávamos enredos onde não existiam e riamos junto com a plateia que aplaudia nossa ousadia e criatividade. Ninguém queria perder um enterro e os colegas dos outros teatros iam assistir e as vezes, até entravam em cena . Era uma festa total que muitas saudades trás. O enterro da peça era o momento mais hilário da temporada, pois saia dos limites e tínhamos a oportunidade de improvisar e mostrar nesta noite todo nosso talento  contando apenas com o aqui agora !

domingo, 5 de julho de 2015

Campista, Pano Verde

Acompanhei durante muitos anos a ruína, a dor e o desespero de amigos viciados em jogos de cartas, pif-paf, buraco, canastra, pontinho, cacheta e poker. Hoje lembro com tristeza cenas que vi e nunca consegui esquecer de pessoas também viciadas em jogos de cassinos como roleta, bacará e máquinas. Campista é um jogo de pano verde, quase igual ao bacará. As cartas são desenhadas de as a rei no pano verde. O máximo da aposta era de 200 cruzeiros em cada carta. Podia se fazer combinações casando uma carta com quantas  quiséssemos. Estes cassinos eram clandestinos, pois este tipo de jogo ainda é proibido no Brasil. São jogos chamados pulos, pois cada noite era em um lugar diferente por causa da polícia. Certa vez fomos jogar na Baixada Fluminense, em São João do Mereti, um lugar já  bastante violento, naquela época. O jogo começava ás 22h e ia até as 04h da madrugada. Duas amigas, uma filha de um deputado e outra dona de um edifício em Copacabana, e eu nos arriscamos muna estrada as escuras e fomos seguidas por um carro . O medo começou a tomar conta, e sem saber o que fazer nos armamos com chave de fenda, lanterna e mais nada. Resolvemos parar na estrada e enfrentarmos os perseguidores . O carro encostou no nosso. Eram quatro rapazes. Um deles baixou o vidro e perguntou: vcs estão indo para o cassino estamos perdidos...Que alivio ! Estamos, respondemos , é só nos seguir. Ufa, que medo ! Na noite seguinte a polícia militar, a mando do Secretário de Segurança do Estado, deu uma batida naquele local prendendo jogadores e trabalhadores . Saiu em todos os jornais, rádios e tvs.Com fotos dos jogadores etc... Foi um escândalo ! Naqueles dias a vida de um jogador era assim, risco total , isto é se correr o bicho pega se ficar o bicho come !!!

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Jogo e Jogadores

Tanto se escreve sobre teatro de revista, artistas que foram famosos e nunca se escreveu sobre Silva Filho, Colé, Walter D´Avila, Ankito, Ema D´Avila, Anilza Leoni e outros ....Mas hoje quero escrever sobre  artistas jogadores e este terrível vicio. Silva Filho foi um deles. Jogador viciado, que até um apartamento perdeu no jogo. Quando começamos a namorar sua vida era o teatro e uma mesa de jogo, assim como Dercy Gonçalves, Nelson Gonçalves, Angelita Martinez Jayme Costa, as irmãs Batista, Linda e Dircinha, políticos, jogadores e treinadores de futebol. e muitos outros.O baralho tem 52 cartas, 4 naipes, ouros, copas, espadas e paus. Cada naipe tem 13 sequencias que vão de As a Rei. Portanto 2 baralhos, 104 cartas. Tudo isto aprendi com Silva Filho. Marcávamos encontros e ele não aparecia, então para isto não mais acontecer ele me levou ao Clube do Amoroso, que era ainda na sua Senador Dantas e lá me ensinou tudo sobre cartas. Um jogador quando tem nas mãos as cartas, o resto não importa, ele só deseja ganhar e mais nada ! Tempos depois eu mesma deixei namorados me esperando por causa do jogo.  Numa mesa de jogo vc pode comprar joias, apartamentos, e até edifícios, na hora do desespero o perdedor, para recuperar seu dinheiro, tudo vende até sua alma se esta tivesse preço ! Minha ajuda veio da minha própria cabeça. Sempre fui muito pé no chão e quando sentia que o jogo podia me dominar, sumia, desaparecia. Vi tantas desgraças nas casas de jogo e nunca quis passar por tal caminho que não tem volta ! Ainda gosto de jogar, mas só para me distrair. Certa vez numa casa de jogo no RJ, um parceiro teve um enfarte. Chamaram a ambulância e como esta estava demorando , deixaram ele deitado no sofá e voltaram as cartas. Assisti pessoas perderem tudo numa noite e se humilharem pedindo fichas ou dinheiro para voltarem para casa.Nélia Paula, que perdeu tudo no jogo uma vez disse:" Há ajuda para os alcoólatras, drogados mas para jogadores como eu , nada !"

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Silva Filho

José da Silva era filho de Antônio da Silva e de Eugênia da Silva, portugueses, também pais de Perpetuo da Siva e Bela da Silva. Por ser muito conhecido como filho do  Silva, famoso alfaiate dos artistas , todos lhe chamavam Silva Filho e este nome ficou sendo seu nome artístico . Nome que o tornou famoso como ator, empresário, autor e diretor de teatro. Tinha um talento incrível para criar tipos que o tornaram um dos maiores artistas do teatro de revista do Brasil. Considerado o segundo grande empresário da Praça Tiradentes, depois de Walter Pinto. Nunca teve ajuda financeira bancando de seu próprio bolso seus espetáculos e até financiando alguns colegas, como Fernando D´ Avila e outros. Foi ele que lançou Elsa Soares que cantava no coro junto a orquestra e quando faltou uma cantora ele a colocou no palco do teatro João Caetano e ela nunca mais voltou ao coro se tornando uma das maiores cantoras do Brasil. Conheci Silva Filho no café do teatro Coliseu em São Paulo, eu tinha 16 anos e a cabeça cheia de sonhos. Depois ele  contou que me achou exibida e convencida. Mais tarde,  ao me ver trabalhar no Teatrinho Jardel, em Copacabana  me convidou para  sua Cia . A revista era É Tudo Juju-Frufru e a estrela  Rose Rondeli. Eu seria a segunda vedete. Tudo que sei sobre teatro aprendi com ele que foi meu mestre, meu amor e também pai do meu filho. Ele era bem mais velho que eu mas, o amor não tem preconceitos e nos apaixonamos perdidamente. Eu o amava tanto que quis ter um filho seu para ter uma coisa dele para o resto da vida . Era tão grande este amor que nos separamos ainda muito apaixonados e ele até colocou um revolver na minha cabeça quando sentiu que a separação era inevitável.  Não era um homem bonito, mas  muito inteligente, charmoso, engraçado e mulherengo Este foi o motivo de nossa separação . Um ano depois  nos cruzamos nas escadas do teatro Rival. Eu descia , ele subia e a dor foi tanta que entrei no camarim do Carlos Mello, aos prantos. Esquece-lo foi muito difícil e dez anos depois, ele quis que voltássemos, mas eu nunca lhe perdoei a traição. Era tarde demais! Ama-se muitas vezes na vida e cada amor é sempre diferente do outro. Mas ele foi o grande amor da minha vida !

segunda-feira, 16 de março de 2015

A Mesa das Vedetes

Na rua Álvaro Alvim, no RJ , além do teatro Rival , havia num edifício no décimo andar, na esquina da Cinelândia, um Clube de Jogo de Cartas. O Clube era de um banqueiro de jogo do bicho chamado Amoroso. Lá jogavam deputados, jogadores e treinadores de futebol, vereadores, empresários, artistas e vedetes do teatro de revista.Muito inteligente, Amoroso criou uma mesa só de vedetes cujo barato ( lucro ) daquela mesa na noite era da vedete do dia. Assim Nélia Paula, Angelita Martinez, Isa Rodrigues, Esther Tarcitano e eu tinhámos  um dia de jogo sem pagar. De segunda a sexta , cada vedete formava sua roda de parceiros e   ficava  com o lucro. Era um chamariz para o Clube e um dinheiro para as vedetes que gostavam de jogar cartas. Havia mesas de vários cacifes ( dinheiro ): muito alto, médio e baixo. Engraçado que todo jogador tinha sua cabula, uns não gostavam que  olhassem suas cartas, outros que usassem seus cinzeiros e aqueles que se ganhassem apoiados nos cotovelos assim ficavam toda a noite. Quem me ensinou a jogar cartas foi Silva Filho . Quando começamos a namorar, ele marcava um cinema e não aparecia, eu ligava para o Clube e lá estava ele jogando! De tanto marcar e não cumprir, ele resolveu me levar para o Clube do Amoroso , que era na Senador Dantas e me ensinou tudo sobre carteados ! Vi muita gente perder tudo o que tinha na mesa do jogo. Vi homens, mulheres tão viciados que até a vergonha perdiam. E como era triste acompanhar a queda de um viciado ! Uma vez a Nélia Paula, que foi uma grande perdedora me disse: " deveria haver uma ajuda para os viciados em jogo como eu, uma entidade qualquer como tem para o alcoolismo..." e havia muita dor e tristeza nas suas palavras ! Sei tantas histórias de jogadores viciados que dava para escrever um livro ! Uma noite na Mesa das Vedetes um homem ganhou a primeira jogada e não queria sair da mesa, para fazer xixi, com medo da sorte lhe abandonar. Foi aguentando até que urinou ali mesmo ! Foi um horror !

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Valete de Paus

As noites de SP sempre foram  e, acho, que ainda são, as mais movimentadas e atratívas do Brasil. Tudo acontecia nas madrugadas de SP .  O paulistano sempre trabalhou muito para tb gastar muito ! Bares, teatros, boites, cinemas, restaurantes, tudo ficava aberto até o sol aparecer. E como era romântico ir até o Ibirapuera ver o sol nascer ! Mas havia tb outras diversões, como os jogos de cassinos clandestinos e os carteados nos  clubes e nas casas de famílias . Estou a recordar os anos 60. No teatro Paramount, na Brigadeiro Luís Antonio " My Fair Lady ", esgotava todas as noites . Era um grande sucesso com Bibi Ferreira, Jaime Costa e um grande elenco . Já na Praça Júlio Mesquita, o teatro  Natal apresentava uma revista  " Vedete sem causa " onde eu era a estrela, que tinha sessões lotadas diariamente. No Teatro Cultura Dercy Gonçalves, com uma comédia, levava o público as gargalhadas com casas cheias sempre. Clara Vaiz, uma cantora lírica casada com um empresário fazia em sua casa ,  as noites, um jogo de cartas ( pif-paf) muito selecionado, para políticos, empresários e artistas. Lá jogávamos, Jaime Costa, Dercy Gonçalves, eu  e outros parceiros importantes na política de SP e do país. Era um jogo alto. Rolava muito dinheiro. Dercy Gonçalves namorava um ator, Rildo Gonçalves de sua Cia que lhe acompanhava e quando ela ganhava chamava- o de "meu amor "e quando perdia pedia que ele saísse de sua frente...coisas de jogador ! Como a sessão de " My Fair Lady " terminava antes do teatro de revista, Jaime Costa pegava um táxi e parava a porta do teatro Natal me esperando para juntos irmos  jogar. Os jornais de SP começaram a noticiar o novo romance Eloína x Jaime Costa, que era apenas um parceiro de jogo e  nada mais ! Uma noite, já de madrugada, na hora de acertarmos as contas do jogo, Jaime Costa achou um valete de paus embaixo da mesa e fez uma revolução ! Não pago, dizia ele, revoltado, jogo roubado, falava Dercy e Clara Vais sem saber o que fazer ! Foi uma noite difícil para todos, pois estavam presentes pessoas importantes do cenário político e artístico do país ! Falou mais alto o bom censo e tudo se resolveu .Mas até hoje eu gostaria muito de saber como aquele valete de paus foi parar embaixo daquela mesa !

domingo, 11 de janeiro de 2015

Lembranças do inverno

Lembranças do Inverno

Faz um frio de atravessar os ossos aqui em Portugal onde estou morando.Este inverno veio com força total, sem dó e sem piedade, castigando mesmo. O que irrita mais é o vento que não respeita os cabelos de ninguém. Folhas dançam num ritmo desordenado levantando a poeira do chão. E este frio me lembra uma temporada que a Cia Silva Filho (na época meu marido), fez em Porto Alegre, RS, Brasil, no teatro Rivoli,na rua Sete de Setembro,quase em frente ao jornal Última Hora. Era Junho, o mês mais frio do ano, e para entrar em cena de biquini, pernas de fora, só vestindo um blusão de lã, e no camarim uma garrafa de conhaque para esquentar. As vedetes do elenco resolveram se casar (acho que por causa do frio, rsrsrs), com os atores. Pares se formaram: Lia Mara x Ari Lopes, Rosemarie Sulquer x José Sampaio, Wanda Moreno x Tiririca e Silva Filho comigo, é claro! Apesar do frio e do minuano que teimava em assobiar, após os espectáculos íamos ao restaurante "Treviso", lá no Mercado Público, onde havia uma cadeira pendurada no teto. Homenagem a Francisco Alves, um dos maiores cantores do Brasil, que morrera num trágico acidente de carro na estrada SP/RJ. Ele era frequentador deste lugar, quando ia a Porto Alegre e sempre sentava na mesma cadeira.Outras madrugadas íamos  num bar/ restaurante perto do Hotel Magestic , onde estávamos hospedados. E , diariamente, lá estavam  Lupicínio Rodrigues, o grande compositor gaúcho e o nosso iluminador João Acir, o Tigrinho . Numa dessas madrugadas geladas Lia Mara brigou com Ari Lopes e vendo a briga Lupicínio , num guardanapo de papel escreveu a letra de uma música que, mais tarde , ele chamou de "Exemplo". Alguns anos que não existem mais o teatro Rivoli e o jornal Última hora Ah! Que saudades daquele inverno!